*Jurandir Santos
Desde 2003, a Lei Federal n. 10.639 tornou obrigatório o ensino da história da África e dos afrodescendentes no ensino fundamental e médio. No entanto, mais de 20 anos depois, ainda hoje, falamos e estudamos muito pouco a respeito desse importantíssimo continente para a humanidade. Além disso, é bom lembrar que o Brasil possui o maior número de africanos e descendentes de africanos fora da África, sejam eles pretos ou brancos.
Conforme nos lembra o Professor Laurentino Gomes (2019), o Brasil foi o maior território escravista do hemisfério ocidental por quase 3 séculos e meio! Pasmem! Recebeu 5 milhões de africanos cativos e, consequentemente, é o segundo país com população negra ou de origem africana do mundo. Os afrodescendentes somam hoje por volta de 115 milhões de pessoas. Também vale destacar que o Brasil foi o país que mais tardou a acabar como tráfico de negreiro e o último a abolir oficialmente o cativeiro americano, em 1888.
Ainda, segundo Gomes (2019), o tráfico de africanos escravizados no Brasil começou por volta de 1535, com o objetivo inicial de fornecer mão de obra para a indústria do açúcar no Nordeste do nosso País – que foi a primeira importante atividade econômica colonial, no entanto, esse tipo de trabalho foi muito rapidamente propagado por todos os segmentos da organização da sociedade e da economia brasileira. Assim, estudar a África equivale a pesquisar acerca da própria história do surgimento da humanidade. Vejamos um pouco mais do porquê.
Embora muitos ainda achem que a África é um país, na verdade, equivale a porção continental mais antiga do planeta, com enorme extensão territorial (com 30.343.511 km²). Para se ter ideia, isso equivale a 22% da superfície da Terra. Possui mais de um bilhão de habitantes, distribuídos em 54 países, tendo a Argélia como o maior deles.
Divisão regional da África de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU)
Conta com uma diversidade étnica invejável, reunindo centenas de grupos falantes em idiomas distintos, distribuídos em mais de duas mil línguas usadas, das quais mil têm origem em África, como kimbundu e o Iorubá. Dentre os idiomas em destaques podemos citar o árabe, o africâner, o inglês, o francês, o português e o espanhol.
E para ilustrar a magnitude desse continente, cabe destacar que foi nesse imenso território que teve origem o processo da evolução da espécie humana, isto há cerca de 4,5 milhões de anos. Os primeiros fósseis foram descobertos em 1924 – os Austrolopithecus africanus - e o mais completo que se tem notícia, na Etiópia, recebeu o nome de Australopithecus Afarensis, ou mais popularmente conhecido como Lucy – que teria vivido cerca de 3 milhões de anos. Sabe-se, ainda que era do sexo feminino e que tinha aproximadamente 20 anos (Macedo, 2020). Somos filhos de Eva, afinal?
Contudo, podemos afirmar que a África representa mais que o berço do nascimento da humanidade (...) pois foram os hominídeos os primeiros homens africanos que, pelas descobertas, tentativas e erros, acumularam a experiência ancestral transmitida a todos os seres humanos (Macedo, 2020, p. 17).
Portanto, poderíamos falar mais da maldita herança da escravidão, da brutalidade e tortura desse povo por mais de 300 anos, bem como das marcas ainda presentes por meio do preconceito, discriminação, segregação e desigualdade social, mas hoje pretendo ressaltar a explosão de cores, sabores, essências, alegria, perseverança e força do povo africano e as maravilhosas heranças ancestrais deixadas por aqui e mundo afora.
São tantos os pensadores africanos desconhecidos do mundo acadêmico, que poderíamos escrever um longo trabalho especificamente com a síntese das suas contribuições, mas vale destacar alguns nomes, tais como: Léopold Sédar Senghor (Senegal, 1906-2001), Henry Odera Oruka (Quênia, 1944-1995), Cheikh Anta Diop (Senegal, 1923-1986), Ebiegberi Alagoa (Nigéria, 1933), Wole Soyinka (Nigéria, 1934). E entre outros tantos, destaco Kabengele Munanga (República Democrática do Congo, 1942), antropólogo e professor brasileiro-congolês, especialista em antropologia da população afro-brasileira, atentando-se a questão do racismo na sociedade brasileira. O Professor Kabengele é defensor de conceitos como “africanidade” e “diáspora africana”, entre outros.
Da língua kimbundu, originária de Angola, parte central da África, incorporamos inúmeras palavras ao nosso vocabulário, tais como cafuné, dengo, caçula, moleque, batuque, berimbau, búzio, quitanda, fubá, dendê, cachaça, muvuca, cuíca, cachimbo e muitas outras.
Vieram com os africanos inúmeros ritmos e instrumentos musicais. O tambor, por exemplo, além das suas funções cerimoniais, religiosas e ritualísticas, alegra festas, marcam passagens e animam danças. Alguns historiadores chegaram a afirmar que esse foi o primeiro instrumento de comunicação à distância.
A capoeira é um exemplo de resistência do povo africado que envolve muitos elementos, tais como a dança, a proteção, o gingado e a malemolência, além dos seus cantos de lamento e propagação da cultura ao longo dos anos.
E as delícias culinárias? Hum, nem me fale... feijoada, rabada, caruru, vatapá, bobó de camarão, acarajé, angu, abará, pamonha, cuscuz, cocada, quindim e uma imensa gama capaz de conquistar sinhô e sinhá.
Dessa forma, só me resta afirmar que África é vibração, cores, arte, resistência, história, memória, ancestralidade. África é a grande mãe da humanidade. Por isso e por muito mais, hoje é dia de comemorar. Viva África! Hoje e sempre!
Leia, estude e saiba mais. Veja algumas dicas de fontes que utilizei para extrair essas informações:
Macedo, José Rivair. História da África. São Paulo: Contexto, 2020
Gomes, Laurentino. Escravidão: do primeiro leilão de cativeiros em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares, volume I. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2019.
BUALA – CULTURA CONTEMPORÂNEA AFRICANA (http://www.buala.org)
MUNDO EDUCAÇÃO. A África é um dos maiores e mais diverso continente do mundo. A economia dos seus países é baseada na extração mineral e vegetal (http://mundoeducacao.uol.com.br/geografia/africa-2.htm)
PORTAL DA CULTURA AFRO-BRASILEIRA (https://www.faecpr.edu.br/site/portal_afro_brasileira)
* psicólogo, pós-graduado em E-Business, mestre em Educação e doutor em Psicologia da Saúde pela Universidade Metodista | Autor dos livros: Educação profissional & práticas de avaliação (Editora Senac São Paulo, 2010) | Educação: desafios da atualidade (Editora Compacta, 2012) | Criança e adolescente em foco: dialogando com profissionais e cuidadores, Org. (Editora Senac São Paulo, 2014) | Professor na Pós-graduação da Universidade Ibirapuera | Parecerista de artigos científicos do Boletim Técnico do Senac | Membro fundador do Grupo de Estudos e Ações para a Paz e não Violência – GEAPAVI | www.jurandirsantos.com.br
Kommentare